Uma
mulher desesperada procurou o centro aonde ia de vez em quando para suplicar ajuda
em favor de seu filho que havia se envolvido com os traficantes do morro e
agora corria perigo de ser morto. Já fazia um dia que ele não aparecia em casa
e os boatos não eram nada animadores. A mulher já não tinha mais para quem
pedir ajuda, os vizinhos já não aguentavam nem ouvir falar no garoto, sempre
ajudavam a mãe e ele voltava a aprontar.
No caminho
para o centro ela ia pensando qual seria o melhor orixá para ajudar seu filho.
Logo pensou em Exu, o grande orixá protetor de todo terreiro e seus soldados
que sempre assumem a linha de frente numa guerra. Depois pensou em Ogum, o
guerreiro vencedor de demandas que adora uma batalha por uma causa justa.
Depois veio Oxóssi, o caboclo de Oxalá, ou Xangô, o orixá da justiça. Assim,
nesse pensar e se enchendo de fé esperança, a mulher foi caminhando em direção
ao templo.
Naquela tarde
a casa estava cheia, sua senha para ser atendida era uma das últimas. Enquanto
esperava na assistência a sua vez, a mulher, cansada de noites sem dormir de
preocupação pelo filho, entrou num sono profundo. Em seu sono ela conversou com
os quatro Orixás que poderiam salvar seu filho.
Exu disse à
mulher que o moleque não era flor que se cheirasse, ele havia procurado os
problemas com suas próprias mãos, e que ele, Exu, respeitava acima de tudo a
Lei Maior, a lei da causa e consequência, a lei que diz que para cada ação
corresponde uma reação, então o moleque tinha que pagar por seus feitos.
Xangô disse à
mulher que ele não gostava de injustiças e que o filho dela devia aos traficantes,
por isso ele deveria pagar a dívida, e se os traficantes continuassem a incomodá-lo
ela poderia procurá-lo.
Ogum respondeu
à mulher que o filho se entregara àquela situação, assim, ele só poderia
intervir se o filho o procurasse e tivesse disposto a lutar também. Ele,
guerreiro da luz que é, só luta por quem faz por merecer.
Oxóssi
respondeu que o guri era um ingrato, já havia o ajudado várias vezes e ele nunca
havia voltado ali para agradecer, então era hora de ele pagar pelos seus feitos,
para tudo na vida existe um limite.
A mulher
desesperada acordou e ficou mais desesperada ainda. Em sua tristeza limitou-se
a rezar em silêncio uma oração simples. Senhor Oxalá, tem misericórdia de sua
filha, o menino é meu filho, não importa o quanto ele tenha errado, eu o amo. Levantou-se
e, sem ânimo de ao menos passar pelos médiuns, entregou sua senha e foi para
casa desanimada. A angústia havia tomado conta da pobre mulher, o caminho de
volta para casa parecia mais triste que a ida ao centro. Parou várias vezes
para chorar e quase chegou a desmaiar de fraqueza.
Chegando em
casa, para sua surpresa seu filho a aguardava sossegadamente no sofá em frente
à televisão. Ela o abraçou em prantos e perguntou o que houve, porque ele
estava ali e tão sossegado.
Mãe, eu não
sei o que aconteceu, só sei que os caras me pegaram e me levaram pra um beco,
eu sabia que ia morrer porque aquele beco é onde ele acertam as contas com os
devedores. Bem, eu já tinha dado minha vida por perdida e nessa hora pensava na
senhora e porque eu não a ouvi antes e abandonei de vez essa vida. Ajoelhei
como eles mandaram e esperei o pior. Ouvi um tiro, e em seguida vários outros
na sequência. Abri os olhos e vi uns caras caídos no chão e os que não estavam
caídos corriam para todas as direções. Eu também corri, nem sei pra onde. No
corre-corre, pega-que-pega vim parar aqui à tarde. Depois fiquei sabendo pela
tevê que a polícia tinha invadido o morro, matado os líderes da gangue, prendido
o resto do bando e ocupado de vez o morro. Então acabou, mãe, não tem mais nada
que se preocupar. Estou livre. Vou tentar me arrumar na vida de agora pra
frente.
Na gira
seguinte, a mãe, mesmo sem entender nada, foi agradecer o milagre, agora na
companhia do filho. Ao ajoelhar ao pé do altar de Oxalá, teve uma visão
esclarecedora. Uma onda de energia arrebatadora irradiou sobre ela e três
mulheres se apresentaram à sua frente. Quem são as senhoras?
Eu sou Oxum,
vim te ajudar porque és minha filha, sou sua protetora, além disso, sou mãe
como você e sei do seu amor por seu filho.
Eu sou Iansã,
vim te ajudar porque não gosto de ver o forte subjugar o fraco tão covardemente,
além disso, sou mãe como você e não suporto ver um filho meu correndo perigo
sem fazer nada.
Eu sou
iemanjá, eu vim em teu socorro porque sua oração foi sincera, além disso, sou
mãe como você e não consigo ver um filho tão amado pela mãe sofrendo sem fazer
nada.
A mulher
agradeceu mais uma vez às três mães e saiu do centro às pressas; algum tempo
depois ela voltou, trazia em suas mãos três flores singelas, que as depositou
uma no altar de Oxum, outra no altar de Iansã e outra no altar de Iemanjá.
Zeca d’Oxóssi da Aldeia Tupinambá
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