sexta-feira, 4 de maio de 2012

UMA MÃE DESESPERADA


DESESPERO NO MORRO

                Uma mulher desesperada procurou o centro aonde ia de vez em quando para suplicar ajuda em favor de seu filho que havia se envolvido com os traficantes do morro e agora corria perigo de ser morto. Já fazia um dia que ele não aparecia em casa e os boatos não eram nada animadores. A mulher já não tinha mais para quem pedir ajuda, os vizinhos já não aguentavam nem ouvir falar no garoto, sempre ajudavam a mãe e ele voltava a aprontar.

No caminho para o centro ela ia pensando qual seria o melhor orixá para ajudar seu filho. Logo pensou em Exu, o grande orixá protetor de todo terreiro e seus soldados que sempre assumem a linha de frente numa guerra. Depois pensou em Ogum, o guerreiro vencedor de demandas que adora uma batalha por uma causa justa. Depois veio Oxóssi, o caboclo de Oxalá, ou Xangô, o orixá da justiça. Assim, nesse pensar e se enchendo de fé esperança, a mulher foi caminhando em direção ao templo.

Naquela tarde a casa estava cheia, sua senha para ser atendida era uma das últimas. Enquanto esperava na assistência a sua vez, a mulher, cansada de noites sem dormir de preocupação pelo filho, entrou num sono profundo. Em seu sono ela conversou com os quatro Orixás que poderiam salvar seu filho.

Exu disse à mulher que o moleque não era flor que se cheirasse, ele havia procurado os problemas com suas próprias mãos, e que ele, Exu, respeitava acima de tudo a Lei Maior, a lei da causa e consequência, a lei que diz que para cada ação corresponde uma reação, então o moleque tinha que pagar por seus feitos.

Xangô disse à mulher que ele não gostava de injustiças e que o filho dela devia aos traficantes, por isso ele deveria pagar a dívida, e se os traficantes continuassem a incomodá-lo ela poderia procurá-lo.

Ogum respondeu à mulher que o filho se entregara àquela situação, assim, ele só poderia intervir se o filho o procurasse e tivesse disposto a lutar também. Ele, guerreiro da luz que é, só luta por quem faz por merecer.

Oxóssi respondeu que o guri era um ingrato, já havia o ajudado várias vezes e ele nunca havia voltado ali para agradecer, então era hora de ele pagar pelos seus feitos, para tudo na vida existe um limite.

A mulher desesperada acordou e ficou mais desesperada ainda. Em sua tristeza limitou-se a rezar em silêncio uma oração simples. Senhor Oxalá, tem misericórdia de sua filha, o menino é meu filho, não importa o quanto ele tenha errado, eu o amo. Levantou-se e, sem ânimo de ao menos passar pelos médiuns, entregou sua senha e foi para casa desanimada. A angústia havia tomado conta da pobre mulher, o caminho de volta para casa parecia mais triste que a ida ao centro. Parou várias vezes para chorar e quase chegou a desmaiar de fraqueza.

Chegando em casa, para sua surpresa seu filho a aguardava sossegadamente no sofá em frente à televisão. Ela o abraçou em prantos e perguntou o que houve, porque ele estava ali e tão sossegado.

Mãe, eu não sei o que aconteceu, só sei que os caras me pegaram e me levaram pra um beco, eu sabia que ia morrer porque aquele beco é onde ele acertam as contas com os devedores. Bem, eu já tinha dado minha vida por perdida e nessa hora pensava na senhora e porque eu não a ouvi antes e abandonei de vez essa vida. Ajoelhei como eles mandaram e esperei o pior. Ouvi um tiro, e em seguida vários outros na sequência. Abri os olhos e vi uns caras caídos no chão e os que não estavam caídos corriam para todas as direções. Eu também corri, nem sei pra onde. No corre-corre, pega-que-pega vim parar aqui à tarde. Depois fiquei sabendo pela tevê que a polícia tinha invadido o morro, matado os líderes da gangue, prendido o resto do bando e ocupado de vez o morro. Então acabou, mãe, não tem mais nada que se preocupar. Estou livre. Vou tentar me arrumar na vida de agora pra frente.

Na gira seguinte, a mãe, mesmo sem entender nada, foi agradecer o milagre, agora na companhia do filho. Ao ajoelhar ao pé do altar de Oxalá, teve uma visão esclarecedora. Uma onda de energia arrebatadora irradiou sobre ela e três mulheres se apresentaram à sua frente. Quem são as senhoras?

Eu sou Oxum, vim te ajudar porque és minha filha, sou sua protetora, além disso, sou mãe como você e sei do seu amor por seu filho.

Eu sou Iansã, vim te ajudar porque não gosto de ver o forte subjugar o fraco tão covardemente, além disso, sou mãe como você e não suporto ver um filho meu correndo perigo sem fazer nada.

Eu sou iemanjá, eu vim em teu socorro porque sua oração foi sincera, além disso, sou mãe como você e não consigo ver um filho tão amado pela mãe sofrendo sem fazer nada.

A mulher agradeceu mais uma vez às três mães e saiu do centro às pressas; algum tempo depois ela voltou, trazia em suas mãos três flores singelas, que as depositou uma no altar de Oxum, outra no altar de Iansã e outra no altar de Iemanjá.



Zeca d’Oxóssi da Aldeia Tupinambá

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