A FORÇA DAS ÁGUAS
Mariana chegou
calmamente ao final dos quinhentos metros da plataforma de concreto depois de
vagar por três horas pela orla da praia completamente perdida entre seus pensamentos.
Aquela tarde o mar estava bem agitado, anunciando perigos ocultos. Mariana parecia
não se importar com o estado do mar, estava resoluta a se jogar da plataforma. Os
ventos fortes agitavam seus cabelos e assoviavam um canto lamentoso e estridente
em seus ouvidos. Apesar disso, o olhar fixo no horizonte marinho lhe dava um ar
de morta viva entre tanta agitação e barulho. A moça não perdeu tempo, subiu as
grades de proteção, também de concreto, e, por um breve momento, ainda olhou as
ondas se chocando contra as pilastras de sustentação da plataforma. Mariana fechou os olhos,
suspirou profundamente, puxando um pouco de ar, e se jogou nas águas salgadas.
O corpo de Mariana, após bater na superfície
marinha, ia afundando pesadamente entre as águas. A moça permanecia com a boca
e os olhos fechados, apenas sentia a força das águas a lhe comprimirem os
ouvidos. Seu corpo parou de afundar a alguns metros abaixo. Pensou em soltar o
ar que prendera entre os pulmões e acabar de vez com seu sofrimento. Abriu os
olhos antes. Foi aí que ela viu.
Uma mulher de
pele escura e manto azul claro, quase transparente, parada a sua altura a lhe
olhar profundamente nos olhos. Era um olhar doce. Sem abrir a boca, a mulher
lhe perguntou em pensamento o que ela estava fazendo ali.
- Não sei
minha mãe, estou sem forças para viver.
- E por que
não desperta essa força em você, minha filha?
- Não consigo,
já faz tempo que estou assim, não consigo reagir. Me aceite em seu reino, minha
mãe.
- Mas ainda
não é a sua hora de vir para cá, filha. Você ainda tem muito a viver na terra,
sua família e seus amigos ainda precisam de sua força.
- Como, minha
mãe, eu posso dar força para alguém neste estado? Não tenho essa força que a
senhora acha que eu tenho.
- Filha, tudo
tem um propósito na vida, até essa sua aparente falta de força. Procure dentro
de você que encontrará a força que procura, ela sempre esteve aí. Lute por sua
vida, não é certo desistir da vida que o Pai lhe confiou.
Mariana quis
chorar, mas as águas do mar lhe apertavam o rosto suavemente. A imagem da
grande figura feminina a sua frente foi se esvaindo aos poucos e se misturando
às águas marinhas até desaparecer de vez. A moça, subitamente, percebeu que o
ar em seus pulmões lhe apertava as narinas para sair. Ela então se projetou
para cima, ajudando a subida com movimentos dos braços e pernas. Na superfície
o mar já havia se acalmado. A moça se agarrou a uma pilastra por algum, tempo
enquanto respirava profunda e repetidamente. Logo ela nadou até a praia com
muita dificuldade. Parecia que a distância percorrida havia dobrado.
Na praia, após
descansar alguns minutos deitada na areia, Mariana, agora aos prantos,
ajoelhou-se e agradeceu com a testa encostada na areia à rainha do mar. A força
das águas nunca mais deixou de ser sentida por ela abandonou desde então.
Zeca d’Oxóssi da Aldeia Tupinambá
(Para Bianca – gratidão)
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