domingo, 11 de março de 2012

EXU CAVEIRA


SEGURANÇA

Na praça central da cidade há muitas pessoas aproveitando o sol na tarde de domingo. As crianças brincam na área de brinquedos sob a vigilância de suas mães, os jovens aproveitam para namorar na grama verdinha à sombra das árvores, os ambulantes vendem seus objetos artesanais e os seguranças rondam a praça a pé na ocupação de encarar as pessoas. Entre os ambulantes está dona Nice, a baiana vendedora de acarajés, e entre os seguranças está seu Geraldo, homem esguio, alto, forte e muito bem para seus quarenta e oito anos de idade bem vividos. Há muitas pessoas na praça nessa tarde, assim como há diversos olhares sobre os acontecimentos. Os jovens olham apaixonadamente seus pares, os ambulantes olham os clientes passarem, os seguranças olham problemas em todos os cantos, as mães olham seus filhos no parque e as crianças só têm olhos para seus brinquedos.

Mas há também um tipo bem comum em qualquer praça de qualquer canto do mundo: os desocupados moradores de rua que, sem verem perspectivas na vida, aproveitam para pedir algo aos transeuntes.  Nessa tarde, um desses desocupados já bem mamado de cachaça na cabeça, se desentende com outro colega de ofício e surta no meio da praça com uma grossa barra de ferro na mão. Todos os olhares da praça se dirigem logo para o surtado que ameaçava qualquer um que tentasse se aproximar. As mães viram um homem sem o carinho e a proteção de uma mãe na infância, os ambulantes viram alguém atrapalhando os clientes, os seguranças viram um problema a ser resolvido imediatamente, os jovens viram um homem que precisava urgentemente de uma mulher para amar e as crianças viram um adulto que não sabia brincar.

Enquanto a praça acompanhava a cena, os seguranças tentavam conversar com o homem e fazê-lo largar a arma no chão. Em vão. Seu Geraldo, que até então estava a distância observando seus parceiros, aproximou e, olhando firme no olho do pobre homem, ordenou-lhe que largasse aquela barra para conversar. Sem chance. O homem, além de não atendê-lo, espetou-o com o ferro na altura da barriga. Seu Geraldo não viu mais nada, partiu para cima do agressor e este, erguendo sua grossa barra de ferro, também partiu para o ataque ao mesmo tempo. Todos da praça viram a iminente desgraça de seu Geraldo acontecer ali mesmo; menos dona Nice, que viu o tempestuoso Exu Caveira tomar a frente do segurança.

 – Exu omojubá! A baiana pedia proteção para o homem de bem. O Caveira, levantando rapidamente a mão esquerda de seu protegido, aparou a barra de ferro em sua própria mão e, num ato quase simultâneo, levou a outra mão de seu Geraldo à garganta do desafortunado estrangulando-o e imobilizando-o. Os outros seguranças tiveram um trabalhão danado pra tirar a mão de seu Geraldo daquele pescoço sujo.

Ao término do espetáculo todos viram, incrédulos, a grossa barra de ferro amassada justamente na extremidade que atingira seu Geraldo, e constataram, surpresos, o segurança sem um arranhão sequer.

Mais tarde a baiana ofereceu um acarajé de graça para seu Geraldo e disse o que tinha visto. Disse também para ele evitar este tipo de combate porque o Caveira não brinca em serviço, quando ele vai, vai pra matar.

Zeca d’Oxóssi da Aldeia Tupinambá

3 comentários:

  1. Legal!!! Gostei, continue escrevendo sempre... Valoriza nossas raízes da forma que a mídia, preconceituosamente não faz!
    Alexandre Bispo

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  2. Olha gostei deste conto, admiro quem este dom de ver o que os olhos da carne não ve.
    Ainda mais vendo o Sr Exu Caveira protegendo seu filho, as coisas acontecem e nos nem sabemos agradecer as vezes, né.
    Exú é mojubá!
    Marcia

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