quinta-feira, 1 de março de 2012

EXU VELUDO


O PROTEGIDO


Ainda se ouviam o toque dos atabaques no terreiro quando certo espírito atrasado, um kiumba muito forte e resoluto, já corria a cumprir uma missão encomendada por uma bela mulher ferida de ciúme. A missão era ferir o corpo e atrapalhar a vida de um ex-namorado da tal mulher enciumada. A pouca distância do rapaz, quando o kiumba se preparava para começar seu trabalho, o poderoso Exu Veludo se colocou no caminho entre ele e o rapaz. - Calma lá, aonde vai com tanta pressa, meu caro?


Surpreso, o kiumba, que não gostava de dar explicações em missões, impacientou-se.


- Eu recebi uma missão, há alguém sofrendo por causa desse sujeito e eu tenho que ensinar uma lição a ele.


- Acontece que esse sujeito aí é meu protegido e eu não vou deixá-lo passar para fazer nenhum mal a ele. O kiumba, pertencente às falanges inferiores, mas muito valente, imediatamente puxou sua espada e o desafiou a enfrentá-lo ali mesmo. Neste instante apareceram quatro outras entidades guerreiras ao lado do Veludo, um parrudo índio de arco e flechas pendurados às costas, uma mulher trazendo à mão uma espada, um homem alto e forte com roupa de marinheiro e um outro não menos forte com trajes orientais.


Uma vigorosa e grave gargalhada do kiumba em tom desafiador então se reverberou no espaço carregado de energias. – Eu vou cumprir minha missão a qualquer custo, pode vir quantos quiser, eu não vou voltar sem fazer meu trabalho para o qual fui designado.


De um lado Veludo e a mulher de espadas em riste, o caboclo de arco e flechas na mão e os outros dois prontos para o combate, do outro o irredutível kiumba obsessor e sua espada; a batalha já ia começar quando uma luz azulada se fez presente, era a rainha Iemanjá que aparecia tentando apaziguar as coisas. – Meus filhos, não há necessidade de luta, acho que podemos chegar a um acordo.


- Odoiá, minha mãe! Falou o Veludo fazendo reverência e sendo seguido pelos outros guardiões do rapaz, para nós, o único acordo possível é ele deixar nosso protegido em paz e ir embora.


- Pois para mim, o único acordo possível é eles saírem do meu caminho e deixar que eu faça meu trabalho, retrucou o impassível obsessor.


Seguiu-se a partir daí uma série de argumentação da grande mãe tentando dissuadir o espírito atrasado de seguir em frente. Nada adiantou. Foi então que Oxalá, que observava tudo atenta e calmamente a distância, aproximou-se de Iemanjá e sussurrou algumas palavras em seu ouvido. A Dama das águas, após ouvi-lo, concordou com um gesto positivo e passou apenas a observar a contenda.


Sem acordo possível, o kiumba, que não abaixara por um momento sequer sua espada, atirou-se com uma bala de canhão sobre os três guerreiros protetores, que se mantiveram firmes de armas em punho. Um brado de caboclo misturou-se outros gritos de guerra, porém, neste momento, Iemanjá emitiu uma poderosa onda de energia azul paralisando e afastando os cinco guerreiros e abrindo caminho para o maldoso egum passar ileso por eles. Surpreso com o resultado do combate que não acontecera, o egum soltou sua gargalhada característica e, embainhando a espada,  seguiu em direção ao rapaz para realizar seu trabalho.


Chegando mais perto, ele observou que o rapaz era um fracote com cara de bobo, não entendeu porque uma mulher tão linda iria se apaixonar por um idiota daquele. Bem, o jeito era começar logo. Aproximou-se mais um pouco e percebeu algo estranho, o rapaz não tinha só a cara de bobo, seu ar era distante e seus gestos atrapalhados. Uma energia totalmente estranha bloqueava a má intenção do egum. Sem compreender o mistério, pôs-se a escutar o coração do rapaz e notou que este batia mais forte que o normal e totalmente descompassado. Percebeu também que ali havia um misto de alegria e dor que era a causa do descompasso do coração. O maldoso kiumba passou então perscrutar a mente do homem e notou que este só tinha um pensamento, uma mulher também com cara de idiota. A tal mulher preenchera todo o pensamento do rapaz, ele estava completamente encantado por ela e aquela energia vinha justamente daquele estado de encantamento em que ele se encontrava. Percebendo que naquele estado era impossível qualquer intervenção maligna, o kiumba soltou mais uma vez sua vigorosa gargalhada e bateu-se em retirada; a mulher enciumada que curtisse sua dor sozinha, ele tinha coisas mais importante a fazer que lutar contra o irascível amor.




Zeca d’Oxóssi da Aldeia Tupinambá

2 comentários:

  1. Saravá, Salve! Ave! Viva! Shalom! Namastê! Laroiê! Mojubá! Pavanã! Malê, Maleime (Maleme, Malembe), Agô! Eterna, Infinitamente, Agradecido, Grato (Mesmo), por tudo de bom, a mim! Sempre! Axé!...

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