A GUERREIRA
Eu sou um dos
filhos da senhora Iansã, ela tem nove filhos e quando partiu deixou para nós um
chifre de búfalo para que pudéssemos chamá-la através dele. Um dia, quando ela
veio nos visitar, eu pedi para ela contar uma história, uma das muitas histórias
que ela viveu nesse vasto mundo guerreando pelos seus. Sim, meu filho, eu posso
contar muitas histórias que eu vivi nas minhas andanças por este mundo. Qual
história você quer ouvir? Quero ouvir alguma história que a senhora viveu com Iemanjá,
ouvi dizer que a senhora tem ciúmes dela, que não gosta dela. Isto é verdade,
minha mãe?
Besteira, meu
filho. Eu sou enviada de Oxalá, sou guerreira, sou mulher e sou mãe igual a
ela, como posso ter ciúme, intriga ou qualquer outro sentimento ruim com a
grande mãe? Eu sempre fui muito senhora de mim, sempre me garanti em qualquer
situação e nunca arredei o pé de qualquer batalha, jamais neguei um pedido de
um filho meu. Por eu ter amado Ogum, recebi dele uma espada para entrar em
qualquer batalha e sair vitoriosa. Por eu ter amado Xangô, o rei de Oió, recebi
dele o segredo do raio e do fogo que sai pela boca. Por eu ter ajudado o homem
mais bonito que conheci, Obaluaê, ele me ensinou os segredo do domínio sobre os
mortos. Ossaim me ensinou os mistérios das ervas e o poder da cura de qualquer
enfermidade. Eu domino também os ventos e tempestades. Desta forma muitas
tribos me chamam para ajudá-las nas mais diversas situações, e eu sempre auxilio
a todos que me pedem ajuda, sem distinção. Durante algum tempo eu ajudei uma
tribo de guerreiros perto do mar do norte, eu era sua guardiã e protetora. Esse
povo era muito forte e próspero, e possuía muitas riquezas em seu território,
por isso eram sempre atacados pelas tribos vizinhas. Como eu era a guardiã
deles, sempre que me chamavam eu estava presente nas lutas e eles sempre saíam
vencedores e sempre aumentando mais e mais seu poder. Com o tempo as tribos vizinhas
perceberam que não adiantavam seus ataques porque eles eram muito fortes e
ainda eram ajudados por mim. Então permaneceram algum tempo sem atacá-los,
juntando forças para um ataque combinado e mais elaborado. Essa guerra foi boa.
As tribos se enfrentavam com ferocidade e o sangue dos guerreiros lavava o chão
do campo de batalha. O combate durou dias. Eu atacava o inimigo sem dó e
inspirava os outros guerreiros que também lutavam por suas vidas. No terceiro
dia de luta, quando já não pisávamos no chão, mas somente em corpos, apareceu
do meio de uma das tribos inimigas um guerreiro realmente forte. Este ia dar trabalho, pensei, ia valer a pena lutar. Naquele momento todos já estávamos
exaustos, mas lutávamos por nossas vidas. Para minha surpresa aquele bravo
parecia inteiro e cada golpe seu era carregado de uma força descomunal. Na
verdade o guerreiro havia sido uma surpresinha de última hora das tribos
inimigas; eles o deixaram de fora da batalha os dois dias anteriores para
descansar e assim acabar comigo quando eu já estivesse bastante cansada.
Eu realmente
não sabia o que fazer. A fome e o cansaço me dominando e o guerreiro avançando
sobre mim com toda sua fúria; os golpes pareciam vir de todos os lados. Já
tinha dado o combate por perdido, mas não ia me entregar, não sem antes deixá-lo
sem algum braço ou feri-lo um pouco para que outro guerreiro pudesse terminar o
serviço mais tarde. Foi quando eu senti uma força atrativa me puxando para o
mar. Não sabia o que era, mas fui atraindo o inimigo para lá. Foi aí que tudo
começou a mudar. O guerreiro precisou tirar sua pesada armadura para poder se
movimentar melhor na água e assim ficou mais vulnerável. Mas ainda assim ele
era muito forte e ágil. Contrariando toda a lógica, fui sentido minhas forças
se renovando mais e mais a cada momento. Parecia que alguma outra força, até
maior que a minha, me dominava. Eu não sabia o que era, só sabia que eu tinha o
controle do combate naquele momento. Após algum tempo o guerreiro, sem alternativas,
procurou dar fuga ao combate. Seria bom ver aquele gigante correndo entre seus
pares, assustado, mas era preciso terminar a luta com dignidade. Mais um pouco
e eu cravei minha espada em seu ventre. O gigante se contorceu tanto que acabou
arrastando a valiosa espada que Ogum me dera de presente com ele para o fundo
do mar. Era o fim da batalha para minha tribo. O campo estava tomado de sangue
e corpos por todos os lados, e os que estavam vivos quase não paravam em pé.
Minha tribo nem comemorou a vitória.
Enquanto
estávamos esbaforidos contando nossos mortos, uma figura feminina muito doce
saiu do mar e caminhou em minha direção. Ela carregava minha espada em sua mão
direita e me entregou olhando docemente em meus olhos. Percebi que aqueles
domínios eram dela e fora ela quem me arrastara para lá, para que pudesse me
ajudar com sua força maior que a minha. Como pode uma figura parecer tão frágil
e tão doce e ainda possuir tamanha força, pensei comigo enquanto olhava no
fundo de seus olhos azuis. Eu pousei minha cabeça no chão lavado de sangue de
bravos guerreiros e a agradeci, todos os sobreviventes fizeram o mesmo. Sem dizer
nada, com seu mesmo ar doce ela se virou e entrou no mar novamente.
Nesse dia eu aprendi uma lição,
meu filho. Não importa quantas armas você tenha ou o quão poderoso você seja,
você sempre precisa de alguém, e nós nunca podemos recusar uma ajuda amiga.
Zeca d’Oxóssi da Aldeia
Tupinambá
É colega, o repertório está crescendo hein,
ResponderExcluirparabéns! As intrigas entre os orixás só existem nos mitos para explicar algumas energias opostas, pois todos trabalham a nosso favor SEMPRE! Abraço.
Alexandre
Muito Legal seu Blog!!!
ResponderExcluirParabéns pelas publições... =)
Parabéns pelo blog, goste da publicação.
ResponderExcluirBjs.
Verônica.
Gostei bastante, parabens!
ResponderExcluirABRAÇOS
Lucia